quarta-feira, dezembro 31, 2008

O balanço

Tal como acontecia todos os anos, no final do ano os economistas foram convocados para fazer o balanço. Chegaram em automóveis de luxo, vestidos com fatos escuros, formaram grupos de trabalho, reuniram-se em horas extraordinárias, analisaram, discutiram e elaboraram relatórios com centenas, milhares de páginas que apresentavam as mesmas conclusões e as mesmas soluções dos anos anteriores – este ano que acabava tinha sido um ano de crise e era necessário garantir que a crise não se prolongasse para o ano seguinte e, como tal, dever-se-ia proceder a cortes nas despesas. O novo presidente optou por não agir como os anteriores e tomou uma decisão diferente. Ordenou: – Despeçam os economistas!

sábado, dezembro 13, 2008

Como uma borracha

Apagar o que está escrito é apagar-me a mim mesmo

terça-feira, novembro 11, 2008

Preferes...

sentir-te bem na mentira do que estar mal na verdade?

domingo, novembro 09, 2008

Desculpa, mas...

...há dias em que não me apetece ser um depósito dos teus detritos emocionais.

quarta-feira, novembro 05, 2008

“Não te conformes com aquilo que não queres”

Um conselho bem intencionado, mas que não serve a ninguém. Não se aplica àqueles que podem escolher; não pode ser adoptado por aqueles que não têm outra escolha.

domingo, novembro 02, 2008

Conveniências

Causas colectivas que se transformam em causas pessoais.
Transformar causas pessoais em causas colectivas.

quarta-feira, outubro 29, 2008

Nunca estivemos tão próximos como no instante que precede a separação.
Estará na altura de virar a página?

segunda-feira, outubro 20, 2008

O que me faz correr?

Para T

Não corro. Permaneço parado. A rotação do mundo leva-me a todo o lado.

domingo, outubro 05, 2008

A espera

R entrou e percorreu atentamente o interior com o olhar. Apenas duas mesas ocupadas. Numa, um velhote a ler o jornal, noutra, dois velhotes em silêncio, com os olhares fixados na televisão desligada. Não está aqui. No relógio, ao cimo da parede atrás do balcão, ainda faltavam 7 minutos. Voltou para fora, sentou-se a uma das mesas da esplanada, à sombra do guarda-sol. Veio o empregado:

– Boa tarde.
– Água com gás, por favor.

A tarde estava quente, bastante quente, quase sufocante. R demorou um pouco a acalmar. Estava ainda tenso, pois ficara retido no trânsito quando vinha a caminho, o que era inesperado àquela hora, naquela altura do ano (Agosto é sempre o mês em que a cidade se encontra quase vazia, pois uma grande parte do seus habitantes parte em férias e, devido ao facto de não haver aqui nada de significativo que possa funcionar como atracção turística, são poucos os visitantes nessa altura), e chegou a recear chegar atrasado. E o pior que lhe podia acontecer era chegar atrasado a este encontro, tal a importância que lhe atribuía. Por esse motivo, mal conseguiu sair daquela fila de trânsito em circulação lenta, acelerou um pouco mais do que era habitual em si, de forma a garantir a sua pontualidade. Felizmente, R tinha por hábito sair cedo de casa quando tinha algum compromisso, sempre bastante mais cedo do que precisava, o que fazia com que chegasse sempre antes da hora marcada. Não fora ter saído com a antecedência habitual e o imprevisto teria feito certamente com que chegasse atrasado. Olhou para o relógio: 4 minutos para a hora marcada.

A água já viera. R entornou no copo cerca de metade do conteúdo da garrafa e bebeu-o dum só gole. Entornou o resto e recostou-se. Ansiava já há algum tempo por este encontro. O fio de suor que deslizava pela sua testa até ficar retido na sobrancelha devia-se menos ao calor do que a essa ansiedade que não desaparecia, antes parecia aumentar. E o facto de ter chegado mais cedo não ajudava; uma espera torna-se sempre mais penosa quanto mais tempo dura, principalmente se não se tem nada para fazer entretanto. Precisava de arranjar alguma coisa para ajudar a passar aqueles poucos, mas tortuosos, minutos que faltavam para a hora marcada. Olhou para as outras mesas à procura de um jornal. Além de ajudar a passar o tempo, a leitura poderia ajudar R a acalmar e até a dar-lhe um ar de maior naturalidade no momento em que M chegasse. Mas o jornal estava a ser lido na única mesa que estava ocupada para além da sua.

Em volta, tudo estava tranquilo. Um início de tarde quase sem movimento em que o calor dilata os segundos num tempo quase suspenso e o rumor ambiente parece prolongar-se continuamente num bordão inaudível. Finalmente, e quase sem dar por isso, R acabou por ser embalado por essa serenidade que o rodeava. Bebeu mais um pouco de água. Estava agora mais calmo.

Apesar de o ar condicionado tornar o ambiente mais confortável no interior do que no exterior, onde estava um calor dificilmente suportável, R optara por ficar no exterior, prevendo que M poderia chegar e sentar-se logo na esplanada, sem ir lá dentro verificar se R estaria lá, evitando assim o incómodo de um deles ter de sair do sítio onde se tinha sentado para ir ter com o outro. Mas começa agora a questionar-se (algo em que não pensara no momento em que se sentou) se M, quando chegasse, não ficaria desagradada com essa escolha, devido ao calor intenso que estava aí fora, mesmo estando debaixo da sombra do guarda-sol.

Abstraído nessa preocupação, R quase nem se deu conta de que o movimento de clientes aumentara, tanto no interior como no exterior e que, em poucos minutos, quase todas as mesas da esplanada estavam ocupadas. Alguém de um grupo de pessoas que chegava naquele momento e se instalava na mesa ao lado pergunta-lhe se pode retirar a outra cadeira, ainda vazia, que estava na sua mesa. R responde que não, que está a reservar a cadeira para uma pessoa que estava prestes a chegar. E, logo de seguida, olha novamente para o relógio. Já passavam 2 minutos. Olha então para o relógio da torre da igreja mesmo em frente, do outro lado da rua, e confirma a hora. Está certa. M estava ligeiramente atrasada. Contudo, não devia demorar. Talvez tivesse ficado retida no trânsito no mesmo local onde R ficara há minutos atrás, ou então, um simples atraso que não carece de qualquer explicação, como é normal acontecer a quase toda a gente em alguma ocasião.

R tira o telemóvel do bolso das calças. Verifica que não há mensagens nem registo de qualquer chamada. Pousa então o telemóvel em cima da mesa. O tempo vai passando naquele calor e a espera começa a ficar maçadora. A ansiedade volta a crescer. R ora cruza os braços, ora os apoia sobre os braços da cadeira, ora pousa os cotovelos sobre a mesa, mas não consegue encontrar uma posição que não se torne incómoda logo passado alguns segundos. E as mãos… o que fazer com as mãos? Nestas alturas uma pessoa nunca sabe como há-de estar com as mãos. As mãos são sempre o que denuncia um estado de ansiedade e nervosismo. Olha para o cinzeiro em cima da mesa e pensa que se fumasse poderia puxar de um cigarro e, pelo menos, teria as mãos ocupadas por alguns momentos. Encontrava aí uma utilidade para um vício estúpido… O jornal… procura novamente o jornal, mas estava pousado na mesa das pessoas que lhe haviam pedido a cadeira e, apesar de não estar a ser utilizado, preferiu não o pedir, pois já sentira que as pessoas o tinham olhado várias vezes, reparando que a pessoa que ele dissera que estava prestes a chegar, 15 minutos depois ainda não aparecera, provavelmente desconfiadas de que R não deixou levar a cadeira por pura antipatia. Começava a ter a sensação de que a temperatura estava a aumentar. Ou seria a sua inquietação que crescia? Não encontrava nada que o ajudasse a acalmar e se M chegasse neste momento iria de certeza reparar no seu nervosismo. Quando M chegasse? Mas agora ocorre-lhe: e se M tivesse já chegado e estivesse no interior? Podia ter acontecido que M tivesse chegado ainda mais cedo do que R e se tivesse sentado no interior, e tivesse ido apenas à casa de banho no momento em que R chegou e foi ao interior verificar se M lá estaria, voltando para a mesa quando R já estava sentado na esplanada. Nesse caso M estaria lá dentro à espera também, provavelmente no mesmo estado de impaciência em que R se encontrava naquele momento.

De fora, o vidro não permitia visibilidade para o interior, mas de dentro via-se para a esplanada, a menos que M estivesse sentada na parte do interior em que o balcão não permite visibilidade para a parte do exterior em que R se encontrava. Ou então, como R estava virado para a rua, de costas para o interior, poderia acontecer que estivesse dentro do campo de visão M, mas sem que esta o reconhecesse. Prevendo essa hipótese, R vai voltando o rosto para trás de vez em quando, havendo assim uma possibilidade de, num desses momentos, M reparar que R está no exterior. Até que, não suportando mais essa incerteza, R levanta-se e dirige-se à casa de banho, como pretexto para olhar o interior e confirmar que M não estava lá.

Regressa e senta-se na mesma cadeira, mais descontraído. Pega no telemóvel com intenção de telefonar, mas logo se detém, pensando que isso iria denunciar a ansiedade que ele não queria deixar transparecer a M. Decide esperar mais um pouco. Afinal, ainda não passara assim tanto tempo. Já esperara bem mais, no passado, por outras pessoas, noutros encontros. Mas subitamente surge-lhe o pensamento de que M poderia ter chegado no espaço de tempo em que ele foi lá dentro e que, não o vendo em lado nenhum, e tendo em conta o tempo que já passara desde a hora marcada – 22 minutos – tivesse pensado que ele se fartara de esperar e tivesse ido embora, ou até que não aparecera, tendo então ela própria decidido ir embora de imediato. R agarra novamente o telemóvel, disposto a desfazer o possível mal-entendido, mas novamente hesita, receando ser inconveniente, pois não quer que M pense que ele está de qualquer forma a pressioná-la. Afinal, um atraso é uma coisa que pode acontecer a qualquer pessoa, e 28 minutos é um tempo de espera ainda dentro dos limites do aceitável. Além disso, como era a primeira vez que tinha um encontro com M, não sabia se ela era habitualmente pontual ou se costumava atrasar-se e, se fosse este o caso, se era habitual atrasar-se muito ou pouco tempo. Bebe o resto da água e decide esperar mais algum tempo.

A espera vai-se prolongando e R não consegue evitar olhar para o relógio com uma frequência cada vez maior. Começa então a pensar na possibilidade de M já não vir ao seu encontro e nas suas possíveis razões: podia ser que tivesse feito confusão com a hora marcada; ou algum imprevisto, algum problema de última hora que tenha a impedido de vir ao encontro que combinara com R, sem ter tido oportunidade de avisar; talvez se tivesse esquecido, talvez aquele encontro não fosse tão importante para si como era para R; podia ser também que não comparecesse por simplesmente não querer; talvez algum acontecimento anterior, ou algo que R tenha dito não lhe tenha agradado e tenha feito com que M não quisesse afinal vir ao seu encontro...

À medida que se vai perdendo com tudo isto na mente, um misto de impaciência e apreensão apodera-se de si. Leva o copo à boca esquecendo-se de que já não tinha água. Não consegue ficar parado durante 3 segundos numa mesma posição. Olha incessantemente para o relógio. Tem a impressão que há pessoas em volta que já estão a reparar há algum tempo no estado de agitação que começa a ter dificuldades para disfarçar. R atingiu o seu limite de tolerância e, agora, 40 minutos após a hora marcada, decide-se finalmente a telefonar. Agarra o telemóvel, procura o número de M na lista de contactos e pressiona o botão de chamada. Espera enquanto o toque soa várias vezes. O toque cessa. No visor do telemóvel aparece “não atende”. Logo de seguida repete a chamada. M não atende. R tenta novamente várias vezes, mas sempre em vão, sempre a mesma mensagem no visor: “não atente”. Será que M não ouviu o telemóvel? Será que não pode atender? Será que não atende por entender que o seu atraso não é assim tão grande que justifique que R esteja já a tentar telefonar-lhe? Será que não atende por achar que R já devia ter telefonado antes, preocupado em saber se teria acontecido algo grave, vendo aí uma atitude de desconsideração da sua parte? R queda-se por tempo indeterminado, com o pensamento vazio, sem saber o que fazer… esperar mais algum tempo, mesmo que em vão? E até quando? Ir embora, mesmo que M possa ainda vir?

– Olá! Cheguei, finalmente. Desculpa o atraso. Obrigado por teres esperado. – R olha imediatamente ao ouvir uma voz, sem sequer notar que essa voz era completamente diferente da voz de M, tal era o seu estado de ansiedade naquele momento. Pelo menos, bastante diferente daquilo que a sua memória conservava como a voz de M, pois há muito tempo que a não ouvia e, ainda por cima, todas as vezes que falaram foi por telefone; e sabe-se que a voz ao telefone adquire sempre características tímbricas diferentes. E mesmo se fosse M que chegasse, R não teria maneira de saber se era realmente ela, pois nunca a vira antes. A confusão apodera-se de tal maneira de si, que R começa até a duvidar se alguma vez marcou este encontro com M, ou se apenas ficou com essa sensação. Aliás, já não tem a certeza de alguma vez ter falado realmente com M ou se apenas o imaginou, pois já não se recorda exactamente quando nem em que circunstâncias. E, nesse caso, não teria maneira de saber se a voz daquela pessoa que acabara de chegar era igual, parecida ou completamente diferente da voz de M.

É então que R tira uma nota da carteira e deixa-a sobre a mesa, presa por baixo do copo, para evitar que seja levada pelo vento que se começa a fazer sentir. Não espera pelo troco. Levanta-se, veste o sobretudo, coloca o gorro na cabeça e caminha por entre as árvores despidas, calcando o tapete de folhas caídas; através do fumo dos assadores de castanhas, com as folhas de jornais que voam baixo e lhe batem nas pernas; baixa a cabeça para proteger o rosto das frias gotas de chuva que vão caindo com cada vez mais intensidade e acelera o passo, tentando desviar-se das poças de água. Já afastado, tem a impressão momentânea de ter ouvido chamar o seu nome longinquamente. Mas não se volta e segue em direcção a um Inverno que prevê longo e rigoroso…

sexta-feira, setembro 12, 2008

Something to believe in

Well the mirror tells a different story
Than the one that’s playing in my mind
Every time I swear I’m looking younger
The more lines that I find
I guess I learned to trade youth for wisdom
And lust in for romance
It’s all written in the stages and phases
Of life’s little dance
But when I want to bitch about growing old
I think how many never had a chance…

"Something to believe in (#2)"
Poison

sábado, agosto 23, 2008

terça-feira, julho 29, 2008

Desprezo e orgulho

Para A
(com orgulho)

Desprezo e orgulho são duas coisas que, quando se encontram, dão mau resultado; seja qual for a origem de ambos (necessidade de afirmação, necessidade de fortalecer a autoconfiança, defesa, carência, mera estupidez…).
Nada mais normal do que desprezar alguém de quem nunca gostámos, alguém que nos repugna, quer existam ou não razões para esse sentimento; em relação a isto, nada a dizer.
Mas há muito a dizer quando se despreza alguém que se estima (ou se diz que se estima). Isso pode acontecer, por exemplo, porque se sabe à partida (ou, pelo menos, se julga, pensando que se conhece a outra pessoa suficientemente bem), que essa pessoa é suficientemente paciente para tolerar o desprezo que lhe é dirigido, pois prefere evitar o conflito e tentar manter a relação saudável. Torna-se então quase um vício incontrolável, um comportamento irrefreável, lançar um olhar, uma palavra, uma sílaba de troça e de desprezo para cada gesto, para cada palavra, para cada acção dessa pessoa; antes de se pensar, já se lhe está a dirigir uma atitude de desprezo, quer o acto dessa pessoa o justifique ou não (isso não importa). Até que, chegando a um certo limite de tolerância, o desprezo leva uma resposta desagradavelmente imprevista (e que, geralmente, só peca por tardia). E, por muito que se reconheça e se tente remediar o erro, agora será o orgulho da outra pessoa que impedirá a reconciliação e a manutenção de uma relação saudável; orgulho (mais do que justo) gerado por uma ferida e que prefere manter aberta essa ferida, ainda que sofra com isso, do que curá-la e abdicar de si próprio.

segunda-feira, julho 28, 2008

Caridade: uma forma de perpetuar a distância entre nós e eles.

sábado, junho 28, 2008

Recitais AMIP




Isto é Verão...

Fazer nudismo na praia e ter pedacinhos de papel higiénico agarrados aos pêlos do cu.

quinta-feira, junho 26, 2008

Para H

Uma vez uma bruxa ensinou-me uma fórmula para transformar tijolo em ouro e uma reza para não envelhecer. E disse-me: “cuidado com o que desejas, pois pode concretizar-se”. Não arrisquei (como, de resto, procedo quase sempre). Nunca saberei como seria se o tivesse feito. Não me arrependo nem deixo de estar arrependido. O saber tem sempre, pelo menos, duas faces. A satisfação de uma curiosidade traz sempre anexada uma tragédia cuja dimensão desconhecemos. Uma revelação não se circunscreve a um momento. As suas consequências estendem-se para além desse momento inicial sem que possamos prevê-las antes que seja tarde demais para reverter o seu curso.

sexta-feira, maio 30, 2008

Palavrescos

Como se criam monstrinhos literários. Aqui.

sexta-feira, maio 23, 2008

Type O Negative - Christian Woman

Porque será que me lembrei disto?

quarta-feira, maio 21, 2008

- Posso beijar-te?
- Não.
- Porquê?
- Nunca se pede autorização.

sexta-feira, maio 09, 2008

A Democracia tem sido utilizada como uma anestesia: uma forma menos dolorosa de manipular o povo.

sexta-feira, maio 02, 2008

Joe Satriani

Ontem, no Coliseu do Porto.
O mestre continua a impressionar.

sábado, abril 12, 2008

Factos e argumentos

Quando os factos não são a favor, usam-se argumentos. E não raras vezes estes vencem aqueles.

sábado, março 01, 2008

A hegemonia absoluta da Imagem conduziu, em linha recta, ao ódio estigmatizado a toda a inteligência discursiva. Odeia-se a História como se odeia a Literatura; a Matemática como as Ciências e as Artes. Em suma, odeia-se qualquer acto intelectual que exija reflexão… Na Escola de hoje, qualquer processo didáctico que se preze não pode dispensar a Imagem, os meios visuais… os esquemas e os gráficos, o mais visuais possível. Discorrer, pôr a inteligência a funcionar, na leitura ou na audição, sobre um texto ou um discurso relativamente longos, já não são mais do que o eco de uma voz que clama no deserto!... Os jovens falam por slogans, motes, frases-chave (que são feitas por outrem); perdeu-se a capacidade de articulação discursiva original, a inteligência e o espírito crítico…

"Linguagem/Poesia/Música", Manuel Reis
O horror económico é quase fazer as pessoas pensar que para estarem vivas têm de merecê-lo… é esta grave confusão entre "utilidade" e "rentabilidade" …

"L´Horreur Économique"; Viviane Forrester

domingo, fevereiro 24, 2008

… a eterna desmistificação e demolição de todo o Poder estabelecido!... Para que as democracias representativas, colocadas no Poder por sufrágio maioritário dito universal, não continuem a ser, afinal, a maneira sofisticada e politicamente admissível de governar em ditadura!

"Linguagem/Poesia/Música", Manuel Reis

quinta-feira, fevereiro 14, 2008

Dia de S. Valentim
Acabei de me cruzar no caminho de um gato preto

domingo, janeiro 20, 2008

Vou sair

apagar as estrelas e beijar a Lua

Quando o mais fraco lidera...

Passam hoje 2 anos


David Hellman (a.k.a. Dave Lepard)
(1980-2006)

Rest In Sleaze

quinta-feira, janeiro 17, 2008

Rumo ao Sul – Primeira página de um romance abortado

Sábado, 12 de Junho de 1999

...o comboio partiu em direcção ao Sul e mergulhou no nevoeiro que enche a manhã – denso, quase impenetrável. Rompe os ventos e avança por entre paisagens de séculos – intactas, permanentes, esquecidas... F. não veio para a despedida...

No interior da carruagem prevalece o silêncio entre desconhecidos, lado a lado, violado apenas pelo som tumultuoso do movimento do comboio, que enche o vácuo entre nós... e os nossos ouvidos indiferentes. Respira-se um cruzamento dos odores de histórias passadas, guardadas em sigilo, e dos destinos recônditos, aguardados passivamente por cada um de nós. Em cada estação repetem-se os rituais: a tristeza de uma despedida, a alegria de um reencontro, uma partida em direcção à incerteza ou um regresso a casa há muito desejado. E depois, novamente, o silêncio. Silêncio carregado de saudade e de ansiedade... ou de indiferença.

Lá fora os raios de Sol quebram lentamente os céus e trespassam o nevoeiro agora débil, invadindo todo o espaço envolvente como uma teia de luz, de sublime textura branca, opaca e ofuscante. A poderosa máquina metálica continua imponente por entre estas terras sem dono… sem nome. Do solo virgem erguem-se, sólidas, as montanhas, habitadas por deuses antigos que descansam agora em segredo. Deuses hoje esquecidos, outrora elevados à magnificência pela excêntrica demência dos feiticeiros extintos. Revelam-se agora apenas no olhar inerte dos seus descendentes, que desconhecem em si o rasto da sua presença e os apagaram da sua memória. E esta janela, esta simples janela, é a barreira intransponível que me separa de todo esse esplendor. Impede-me de sentir, de ser parte desse mundo primordial, puro, absoluto, que apenas posso observar com estes meus olhos vazios, desprovidos do seu frémito original.

Olhos cansados, cedem por alguns instantes ao efémero sonho de nada que me corta a vigília... leva-me agora para além desta janela, numa flutuação confusa por entre imagens pouco nítidas, sem sentido. Onde estou?... Volto a acordar e olho mais uma vez pela janela. O comboio começa a parar. A estação final. Os últimos passageiros tomam os seus haveres e preparam-se para sair. Levanto-me.

Para onde vou, neste lugar desconhecido? O futuro recusa-se a desvendar os seus segredos neste último dia do meu passado. E recordo... recordo ainda o silêncio, as paisagens, o sonho... F. não veio para a despedida.

segunda-feira, janeiro 07, 2008

Uma relação esquizofrénica (3)

Tu nunca me ouves e eu nunca me lembro do que tu me dizes. E mesmo assim, sempre que nos chateamos é por causa do que dizemos um ao outro.

Uma relação esquizofrénica (2)

Agora quase nunca tenho vontade de estar contigo e tu quase nunca tens vontade de estar comigo. E quando queremos estar um com o outro é só para nos atacarmos, vingar ressentimentos.

Uma relação esquizofrénica

Temos uma relação esquizofrénica. Podia dar certo. Mas no nosso caso não funciona. É como se fossem quatro pessoas, mas os pares certos nunca se encontram.

A fase de Kafka

Numa conversa acerca de gostos literários referi que Kafka é um dos escritores de que mais gosto, ao que a outra pessoa retorquiu: “Kafka? Já passei essa fase!” Confesso que fiquei baralhado. Mas como é que, nos dias de hoje e no contexto social em que nos encontramos, Kafka pode ser uma fase que passa? Nunca como hoje a literatura de Kafka foi tão actual, pois nunca como hoje a sociedade esteve tão obcecada em adoptar os comportamentos absurdos que a sua literatura descreve. O absurdo que Kafka utilizou para fazer boa literatura tem vindo a transformar-se num absurdo real, tem vindo a tornar-se cada vez mais no rumo que a nossa sociedade teima em seguir como se fosse uma fatalidade. E só quando comecei a escrever este texto percebi como se passa a fase da literatura de Kafka para entrar numa outra fase: aquela em que a literatura de Kafka passa para o real e se mistura com o quotidiano pessoal e social. E isso significa que esquecemos a sua lição. A lição de Kafka consistiu em mostrar-nos aquilo que deveríamos evitar e nós, ao invés, fazemos disso o nosso modelo social. A fase de Kafka está longe de passar.

terça-feira, janeiro 01, 2008

Ausente

Estás online mas o teu estado diz "ausente"; e uma ausência é apenas a memória de uma presença.