segunda-feira, janeiro 07, 2008

A fase de Kafka

Numa conversa acerca de gostos literários referi que Kafka é um dos escritores de que mais gosto, ao que a outra pessoa retorquiu: “Kafka? Já passei essa fase!” Confesso que fiquei baralhado. Mas como é que, nos dias de hoje e no contexto social em que nos encontramos, Kafka pode ser uma fase que passa? Nunca como hoje a literatura de Kafka foi tão actual, pois nunca como hoje a sociedade esteve tão obcecada em adoptar os comportamentos absurdos que a sua literatura descreve. O absurdo que Kafka utilizou para fazer boa literatura tem vindo a transformar-se num absurdo real, tem vindo a tornar-se cada vez mais no rumo que a nossa sociedade teima em seguir como se fosse uma fatalidade. E só quando comecei a escrever este texto percebi como se passa a fase da literatura de Kafka para entrar numa outra fase: aquela em que a literatura de Kafka passa para o real e se mistura com o quotidiano pessoal e social. E isso significa que esquecemos a sua lição. A lição de Kafka consistiu em mostrar-nos aquilo que deveríamos evitar e nós, ao invés, fazemos disso o nosso modelo social. A fase de Kafka está longe de passar.

3 comentários:

Anónimo disse...

Lembrei-me de um filme recente, francês, «Muito bem, obrigado» - viste? Não me recordo o nome do realizador, acho que não era conhecido, os actores também não, mas era sobre isto de que falas: o absurdo real de hoje. Ou talvez não: depende daquilo em que estás a pensar quando falas de hoje... Diz-me tu.

ricarva disse...

Olá Alexandra! Onde viste esse filme? Será que ainda está em exibição?

Unknown disse...

Olá, com licença, homúnculo. Acredito que A metamorfose de Kafka nunca foi tão cabível como em nosso mundo de hoje. George Samsa somos nós em nosso medo de sermos descobertos num mundo de aparências e lugares-comuns. Se quiser ler nessa terra irmã o espero.